quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Timidez

Espiar.
Esbarrar os olhos.
Sorriso amarelo,
Desviar o olhar.

Fingir uma conversa.
Rir bem alto
Curtir a música,
Suspirar.

Correr a mente pelo teto,
Virar a cabeça:

Esquerda
Direita
Centro.

Tamborilar os dedos na mesa
Borboletas no estômago.

Tomar coragem,
Erguer o rosto

Espiar...

domingo, 11 de setembro de 2011

Canção da Lua

E a mesma amiga da noite (daquelas que sabem perfeitamente a hora de abraçar) canta pelo vento, bem assim:

"Menina, se o peito aperta de saudade, e o abraço está longe, não se preocupe.

Chore o calor do verão, as mãos do outono e o frio do inverno. Mas - fé, menina! Hás de sorrir

Que a primavera chega, e bens sabe que és semente ainda. Projetinho de flor.


Mas um dia, menina, quando não estiver pensando
Num bocejo qualquer, floresceras.
E verás como vejo: és bela

Então larga essas mãozinhas encolhidas e beije suas lágrimas de açúcar e sal

E sorria.

E canta, e viva, e dança.

Que és flor doce

E chegou a primavera"

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

Caderno velho (3)


Infelizmente, não anotei a data desses :/

Ah, daqui a pouco eu posto o Capítulo três da história e pans. Acho que não é lá a coisa mais original do mundo, mas (once again, acho que) é gostosinha de ler... A faculdade tem tomado um pouco de tempo, de qualquer forma.

Beijocas!

“Lúcia e Bernardo, então, tiveram pouca ou nenhuma opção de escolherem a presença um do outro – mas de um jeito peculiar, os amigos acabaram por ser quase como irmãos”

“Esperavam que eu fosse a Rapunzel desse conto, mas há muito escapei da torre, rumo à liberdade”

Deve haver sentido e conforto numa vida limítrofe. E é isso que me preocupa, é isso que me transforma num peixe fora da água

Só vivo feliz na minha realidade cheia de problemas. E de súbito, me parece que é tudo belo, e não canso de olhar o mundo

Esta meia verdade em que vivo...

Por ser tão pão-dura de mim, estou me jogando fora. Esse meu regime de nada e desorganização precisa ser revisto

Não quero fazer o dever de física, e que se danem os positivos. O que eu quero é ser livre!”

A coisa mais desagradável de se estar num exército não é o local, apesar de o nosso quartel ser medonho. Nem a gororoba que te servem como comida. O que é realmente detestável é ficar longe de quem você gosta, longe de sua casa, e sem ter a certeza de que está tudo bem”

Meu coração estava apertado, e nada que eu tentava fazer para me aliviar funcionava. O céu castanho me espremia, e senti todo o peso da tempestade em cima de mim. Esmagando, esmagando...”

Só não te amo em espanhol:

É muito feio.

Mas eu te amo”

“Meio que não dá. Tenho seu nome tatuado em minhas olheiras, e é sua lembrança que me escorre pelos olhos. Meus livros vêm escritos em suas letras, você me cerca sem saber. E me roubou as músicas, o sono e o tempo livre. Roubou-me de mim mesma”

Meu estômago queima, minhas mãos suam e tremem. As palavras me fogem, meu corpo formiga. Não sei o que fazer com minhas mãos (não sei o que faço comigo)

Meu coração leve é quente e rápido, e seguro ele entre meus dedos, no espaço onde deveriam estar os seus

As nuvens se dissiparam, perdi as cores e fiquei no escuro. De novo”

Não sou atriz, não consigo forçar a vida. E a vida também não suporta ensaios: é a inconstância do improviso

Tive a sorte de estar despreparada

“Afinal, nascemos unicamente para a liberdade e para o amor. O resto é tudo perversão”

Não é preciso ser perfeito. Não é preciso ser completo. Suba na ponta da sapatilha, faça a ronda do quarto. Porque aí vem a primavera”

sábado, 27 de agosto de 2011

Capítulo 2 - Era uma vez

Era uma vez uma criança, que haveria de crescer e se tornar o velho Dionísio do qual falávamos.

Por hora, mal entendia o mundo, sendo pequeno, rosado e feliz.

Como toda criança, possuía seu papai e sua mamãe. Estes, por sua vez, possuíam uma reputação não muito boa, e dívidas de aparência ainda pior. Nunca haviam ligado muito para qualquer dessas coisas - mas era difícil permanecer indiferente à vida quando certo menino chorava no meio da noite, quer de fome, frio, calor ou saudade.

Tiveram, ao que pareceu, uma ideia incrível: tirariam férias todos os verões. E como férias significavam (acima de tudo) férias de Dionísio, deixavam o menino aos cuidados da avó paterna, Isabel, durante os três meses da estação. Grave bem o nome dela.

A experiência se mostrou agradabilíssima ao senhor e a senhora Campos, e tornaram a repeti-la. Os verões, todavia, se prolongaram. Converteram-se em outono e inverno, primavera e um novo verão, que virava outono...

Para encurtar, resta dizer que Dionísio, já velho, ainda vivia o eterno verão.

E sabe? Nunca ligou muito para isso. Felizmente, tinha a melhor avó de todas e, por muito tempo, Isabel era a família que lhe bastava. Chamava-a de Nana, e nós também a chamaremos assim.

Nana possuía aquele charme inato às avós, que é capaz de derreter o coração da maioria das pessoas. Arrebatara o netinho desde o primeiro momento, com o coque grisalho, os olhos bondosos e os biscoitinhos de nata. Era toda saudade, do marido e do filho (relutava em admitir - havia muito nele que era uma versão corrompida dela mesma, e é tão difícil se perdoar...).

Esquecia da dor, porém, quando olhava para o neto. Era como se a criança fosse mais filho de seu marido do que seu próprio filho. Percebia no modo em que o garoto franzia a testa, ou sorria, e até mesmo nas conversas e silêncios. Amou-o desde o primeiro momento, e queria ter certeza que não erraria com ele. Firmou os pezinhos do menino, o ensinou as palavras e as coisas. E não podia deixar de ser grata pela herança que o marido deixara, a qual lhe permitia uma vida confortável.

Sua casa era tanto quanto afastada da cidade, mas não chegava a ser um sítio. Nana não tinha lá muito jeito com criações, e possuía verdadeiro horror a galinhas. Na verdade, houve uma vez...

- Nana, olha o que eu achei! - dizia o menino, escondendo algo com ambas as mãos.

- O que foi, Ni?

- Pintinho!

Mal olhou para a bolinha amarela e inofensiva nas mãos da criança e se pôs a gritar. Um tanto quanto aflito, deixou cair a pequena ave, que piou desesperadamente por uns dez segundos. Nana se acalmou um pouco, porque cuidava de um menino pequeno - e se tratando dessas criaturinhas adoráveis, silêncio raramente é um bom sinal.

Acontece que Dionísio não sabia bem como reagir, e tomou a única solução que lhe veio a cabeça.

Uma massa informe, vermelha e ensopada, encontrava-se sob um dos pés (felizmente calçados) do menino. Ele desviava o olhar do misto de sangue e penas amarelas, engolindo um choro mal-disfarçado.

Nana limpou toda a bagunça e ambos preferiram não tocar mais no assunto.

// - // - //

Eram tão feliz quanto se podia imaginar, e isso já era muita coisa.

Algo, porém, preocupava Nana: o menino era só. Faltava alguma coisa em sua risada. Era, talvez, a criança mais séria que conheceu. Sabia que o garoto a amava tanto quanto ela a ele, mas não era certo que fosse sua única companhia. Seria realmente difícil levar Dionísio até a cidade todos os dias, para que pudesse brincar. E mesmo quando tentara, o neto havia rejeitado trocar sua avó por aquele monte de crianças barulhentas. Não estava acostumado, não se sentia preparado.

Sabendo que isso não poderia de forma alguma fazer bem ao garoto, ela orava para que os céus enviassem qualquer anjinho disposto a ajudar o neto.

Às vezes, as preces sobem com cheiro de perfume agradável, dançando com a brisa. Então milagres realmente acontecem...

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Entre o primeiro e o segundo: Ainda não era uma vez

Era uma vez, pois sim!

Porque, afinal, se iniciamos algo, nada melhor que essas três palavrinhas.

Nosso maior problema, porém, ao começar qualquer coisa com tal combinação, é que o final deve se encerrar com um "felizes para sempre", e não é assim que as coisas funcionam, se você entende um pouquinho da vida. Talvez porque ela simplesmente não acabe, e um fim não signifique o fim.

Há, ainda, outro problema. Poucas histórias são tão dignas do "era uma vez" quanto os contos de fadas, e não é esse o caso. Aqui não encontramos fadas, príncipes, castelos e bruxas. Não há reino a ser salvo heroicamente, ou maldição a ser quebrada. Nem dragão, espadas ou recompensas.

Ao invés disso, encontraremos um garoto mimado, uma avó com rugas nos olhos e um menino com fome. Piano velho, tinta a óleo, álcool. Encontraremos garotas e amigos, e uma garota em especial. E tantas outras coisas que não me atrevo a contar agora, mas acabaram por moldar cada sulco do rosto de Dionísio, e da própria alma do velho - que os anos moldam-nos todos, mais do que nós a eles.

Com todos os contra-pontos indicados, todavia, vamos começar com o "Era uma vez", de qualquer forma. Quem sabe o protagonista o mereça, afinal.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Capítulo 1 - A casa e o velho

Naquela casa empoeirada, vivia certo velho ranzinha, que acontece de ser o protagonista desta história.

Cabe, de antemão, reforçar que, por casa, leia-se apartamento, apesar de seu inquilino recusar-se veementemente a chamá-la assim. Como todo bom velho, possuía suas manias injustificáveis.

Primeiro, tratemos da casa:

Havia uns poucos móveis antigos, e várias manchas de tinta seca espalhadas no piso de taco. O encanamento vivia dando defeito; a localização não era assim tão boa. Frio demais no inverno, um calor insuportável no verão, o apartamento ainda possuía janelas difíceis de serem abertas, e a visão abrangia apenas os fundos de outros apartamentos – na melhor das hipóteses, enxergava-se uma pracinha mal cuidada.

Em todo caso, falemos agora do velho:

Talvez a moradia seja expressão concreta do interior das pessoas, ou ao menos era, nesse caso. Tal como sua casa, o velho nem sempre fora empoeirado, vazio e, afinal, velho. Mas o tempo escava aqui e ali, na terra e no peito. No fim, terminamos todos andando meio devagar, e reclamando um bocado, e visitando mais médicos do que gostaríamos.

Chamava-se Dionísio, que era o nome de se avô. E agora, mais que nunca, percebia a semelhança entre ele próprio e o Dionísio que lhe batizara: o mesmo rosto cheio, nariz grande, barba por fazer, cabelo curto. Alto e quieto (ainda que houvesse, nos últimos anos, adquirido o hábito de resmungar), cultivava poucas vaidades. Era impecavelmente limpo, e, por vezes, bebia vinho após o almoço.

Vivia só, gastando o tempo de aposentado passeando pelo bairro, visitando o Centro quando necessário. Sua paixão era, todavia, a pintura e o desenho. Sentia um prazer todo especial com o perfume das tintas, o toque do pincel, ou o som do lápis percorrendo a folha. Enchia páginas brancas, telas nuas de cor e vida, retirada dele próprio, reforçando os vincos em suas mãos firmes. De fato, era assim que funcionava: arrancava lembranças do fundo da mente, rotas de tempo e saudade, exprimindo-as em cada pincelada, numa fúria suave, contida.

Dionísio procurava nas lembranças qualquer motivo que justificasse a vida que levava no momento (como eu já disse, nem sempre fora assim, com dias ocos de sentido). Já fora feliz. Mas suas perguntas ecoavam no vento, e as respostas não se escutavam. Porque eram tão desesperadoramente óbvias que não havia alternativa além de se fazer surdo.

Princípio de agosto, ele daria início a sua rotina das quartas-feiras. Passaria na padaria de sempre, compraria rosquinhas de nata e geléia de morango, comprando, na volta, outra edição daquelas revistas de sudoku, das quais tanto gostava de solucionar. Resolveria um número considerável desses problemas, assistiria algo na TV e, depois do almoço, cochilaria.

Queria ter a sorte de acordar apenas no outro dia, mas não seria possível, de modo que deveria assistir um ou outro programa na televisão, antes de observar o movimento na pracinha e, caso estivesse de muito bom humor, pintaria. A mera possibilidade serviu para elevar seu ânimo, e foi em tal estado de espírito que abriu a porta da frente, não sem antes se vestir e perfumar adequadamente, o que contribuía ainda mais com seu bem-estar. É difícil prosseguir com a cara fechada quando se está devidamente limpo e confortável.

Esfregou os sapatos no capacho, e havia fechado a porta, quando avistou no final do corredor o rosto do vizinho, seguido do próprio. Dionísio sentia-se especialmente mal quando o encarava: é que o senhor, um pouco mais velho que ele, possuía um conjunto caprichado de cicatrizes profundas, no lado esquerdo do rosto. Iniciavam-se no queixo, e se tornavam mais intensas conforme subiam em direção a bochecha. Suavizavam-se abaixo do olho, e terminavam por desaparecer antes da sobrancelha. Mancava um pouco, e tais marcas seriam reflexos de um passado doloroso. Essa espécie de pensamento incomodava Dionísio, que manteve olhos fitos no chão, cumprimentando o outro velho com um aceno de cabeça, enquanto apressava o passo e descia as escadas.

Descendo o segundo lance, ofegava, e não percebera que a faxineira havia acabado de fazer a limpeza daquele andar – em termos de faxina, quarta-feira significava nada mais nada menos que cera.

Ele detestava aquela cera. Por mais de uma vez, cumprira o papel de velho ranzinza, e reclamara com o síndico sobre a cera e o risco eminente de quedas. Mal sabia ele o quanto estava certo.

O pé esquerdo não pousara com a firmeza necessária, e acabou deslizando, levando o resto do corpo junto. Foi o tempo suficiente para que ele se lembrasse quantas vezes, exatamente, havia reclamado sobre aquela porcaria, enquanto perdia o chão, reencontrando-o bruscamente.

Derrapava pelos degraus e, numa atitude que mesclava reflexão e instinto, conseguiu proteger o pescoço da rota de colisão. Haja o que houver (como gostava de pensar), o bulbo deveria permanecer intacto. Tinha verdadeiro pavor de perder o controle da respiração, e morrer asfixiado, buscando desesperadamente algo que o cercava. Sentiria, mais uma vez, o peito rasgar-se, e Dionísio não aguentaria uma segunda vez.

De qualquer forma, ainda havia muito com o que se preocupar. Quando finalmente atingiu o fim do lance, não sabia que parte do corpo pesado doía mais, e os movimentos lhe pareciam impossíveis. Um líquido quente escorria debaixo do braço esquerdo, sensação parecida com a que sentia por entre as pernas. Torceu para que a última fosse urina.

Pode constatar, contudo, que não iria fazer muita diferença: morria.

A visão turva abrangia somente o teto, e faltava coragem para tentar algo mais. Respirar ardia, e ele preferia que aquilo tudo já estivesse acabado. Não demorariam a acabar, de qualquer forma.

Cabeça leve e estúpida, olhos que teimavam em fechar, e um velho cansado, que já havia desistido. Morria, então. E era melhor que alguém reclamasse em seu lugar sobre a maldita cera. Sorriu. Era uma morte ridícula, mas morria com razão, como um mártir. Seria seu conforto final.

Dionísio estava certo: era uma morte muito ridícula. Mas de certa forma, todo fim é ridículo, salvo exceções, e o tempo cisma em dançar num compasso diferente a cada instante.

É um tanto melhor interromper a história nesse ponto. Pois se há fim, houve meio e princípio, tarde e manhã. Não foi diferente com ele, e convém lembrá-los, antes que se faça qualquer coisa - ainda que seja com esse velho ranzinza.

Quixote




Quando a loucura invade a mente, nada mais resta senão sorrir e redescobrir a realidade. Estão aí, os gigantes de moinhos de vento. Mas não há como descobrir sem os enfrentar.

As pernas erram os passos, então costuro caminhos com retalhos e saudade, numa colcha mal-feita.

E o cavalo é manco, o escudeiro se foi. Dulcinéia de nada desconfia, a armadura é a saudade cerzida em retalhos (da qual me referi). A lança é a caneta; eu perdi as palavras. Viseira do capacete baixa, sequer consigo enxergar.

Não importa, porém, que se vença. Porque só ligo para o ideal, entre o sonho e a alucinação. É lutar contra os gigantes, pelo prazer da convicção e a energia viva. Pouco importa, porque no final (afinal) eram moinhos, e só. Mas valeu o riso, o esforço, a pena e a intenção.